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11 de julho de 2013

ÉRAMOS SETE - Renato Lôbo

Éramos sete. Ficamos seis.

O tempo parou numa manhã de Natal, num domingo, cedinho, num silêncio de cortar com faca, interrompido apenas pelo canto de pássaros que voavam baixo e pelo som da pá de pedreiro raspando cimento na laje fria.

É que ninguém acreditava naquilo e esperava a qualquer momento despertar do pesadelo. A pá do pedreiro terminou o trabalho, calafetou as fendas e o milagre não aconteceu. Nem mesmo por ser manhã de Natal.

Éramos sete. Sobramos seis.

Peraí. Na verdade, nunca fomos sete, sabe, o número sete: um, dois, três... Nós já fomos seis, cinco, às vezes, quatro. Sempre estivemos espalhados, por aí. Éramos sete. Mas nunca fomos sete, direito. E agora, a menos que não seja verdade, daqui pra frente, seremos só seis.

Mas quando éramos sete, os sete juntos, inteiramente sete, aí a gente “aprontava o sete”.

Você se lembra daquela vez em que a gente literalmente barreou a porta da insuportável vizinha jogando bolinhas de barro? A bem da verdade, não foi exatamente “barro” o que a gente atirou àquela porta, mas poderia manchar a reputação dizer aqui o material artístico exato de que foi composta a obra.

E você chegou a contar quantas telhas da vizinha do quintal de baixo a gente quebrou naquele bombardeio de manga verde? E você se lembra das imprecações da senhora sua mãe a respeito de uma certa torre de antena encostada no alpendre? Não subam aí!, ela disse. Bastou sair e... Bem, o resto já está nos autos.

E você se lembra do dia em que encheu o banheiro (o único) da casa com anfíbios canoros (ditos sapos!) e da gritaria da ala feminina do consórcio familiar? Naquele dia, você apanhou legal! Pela “Sociedade Protetora das Mães” a gente já estava em cana, faz tempo!

Como podia esquecer quando você começou a Odonto e trouxe para dentro de casa (observe o advérbio “dentro”) uma caveira humana numa sacola de papel, debaixo do braço – assim – como se fosse pacote de compras?

E você se lembra daquela vez em que (você) teve a elegante idéia de estabelecer uma ligação direta do bocal da lâmpada com um fio de arame, e só a sorte não nos deixou segurar diretamente no arame? Foi fogo pra todo lado. Caramba! A gente podia ter colocado fogo na casa e isso ia ser o de menos! Naquele dia, éramos dois. Mas valíamos pelos sete. É que, geralmente, éramos sete. Mas valíamos – por baixo? – por dez!

Mas agora somos, irremediavelmente, seis.

Você quis tanta coisa! Mais coisas do que cabia em você! E agora que você foi embora ficamos mais sozinhos, bem mais vazios e muito mais pobres. Muito mais pobres do que a simples humanidade nos condiciona a ser. Nunca mais aquele riso em cascata. Nunca mais as tiradas de humor. Nunca mais as explicações sobre o funcionamento do universo. Nunca mais as “coisas de Aloísio”!

Éramos sete. E sem você não somos nem seis, nem cinco, nem...

Ta certo. Nós construiremos um monumento, contaremos suas histórias, guardaremos as lembranças. Parece que é assim que se faz. Mas nenhum monumento terá o seu tamanho, nenhuma história, a sua cor de voz, nenhuma lembrança, o seu perfume de alma. É que você não era daqui. (Tem gente que não é!) Não fazia parte desse sistema. Você não se enquadrava, não cabia, não se satisfazia, apenas.
Mas tem mais. Você se recusou a se enquadrar e a caber. E ainda menos a se satisfazer, apenas. Você era único. Sem você, isso daqui onde o resto cabe e se enquadra e se satisfaz, ficou bem menor e sem graça.

Éramos sete.

E vamos continuar sete, viu, Sérgio!

Minto.

Pressinto que seremos oito. Há uma lembrança que preencherá o oitavo lugar desse trem que, só momentaneamente, descarrilou. Só momentaneamente! Seremos oito. O seu lugar será preenchido de histórias. E esse será o milagre da vida. Será o seu milagre. O primeiro. Se alguém contou a última história, não foi você. Você? Ara! Jamais. Nem que quisesse. Nem que quisesse.

(Aloísio Lobo da Costa saiu pra visitar Deus no dia de Natal de 2011. Pelo tanto de histórias que ele tem pra contar, decerto, não volta tão cedo.)

4 comentários:

Anônimo disse...

Este Aloisio Lobo é o garoto que em 1974 trabalhava na Embraer como guarda mirim?
Se for ele,em 1974 a pedido de sua mãe ele que me ajudou a entrar na Embraer,onde trabalhei por 18 anos.Donizetti

Anônimo disse...

Sim, era ele mesmo. Renato Lôbo

Anônimo disse...

Quem foi visitar Deus ?

Maria Aparecida disse...

Muito lindo. Parabéns, Renato!

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