Há muito tempo, numa terra distante, três sábios procuravam o Rei dos reis. Esta é a história do quarto sábio. Seu nome era Ártaban.
Ártaban, de Maji, um principado da antiga Pérsia, era príncipe, médico, homem famoso, rico e culto. Era respeitado por todos. Mas, um dia, um incêndio devorou-lhe a casa, a mulher e os filhos. E ele passou a se dedicar ao estudo das estrelas, para encontrar nelas uma razão que lhe trouxesse de volta o sentido que o fogo levou. Vasculhando o céu, percebeu que o aparecimento de uma estrela nova coincidia, justamente, com antiga escritura que anunciava o nascimento do Messias. Ártaban vendeu tudo o que tinha, comprou três presentes (uma safira, um rubi e uma pérola, todos de extraordinária beleza) e partiu à procura do rei nascido.
Na hora da partida, o pai, lhe diz:
- Tens certeza de que essa estrela irá trazer-lhe uma nova luz em sua vida, e não apenas uma sombra ainda maior, mais vazia e escura?
Ártaban não foi capaz de responder. Então, o pai respondeu por ele:
- Vá. É melhor perseguir uma sombra, do que sentar-se e apenas ver a vida passar!
E ele partiu atrás de seu rei.
Mas, por um único atraso, Ártaban se desencontra dos três outros sábios que também partiriam ao encontro do rei. Apenas um velho, no deserto, lhe informou que o Messias não nasceria em Jerusalém, como se esperava, mas em Belém. E Ártaban parte, novamente. E chega a Belém. E a cidade vazia logo lhe prenuncia o pior: os soldados de Herodes atacaram a cidade em busca de todos os meninos menores de dois anos. Na lufa-lufa do desastre, para defender uma mãe e seu filho, ele dá ao soldado o primeiro presente que havia reservado para o rei, um terço da sua fortuna: o rubi. Ártaban encontra-se um terço mais pobre. Só a esperança continua inteira.
Então, fica sabendo que o casal fugiu para o Egito. Vende a safira, a segunda terça parte do tesouro, e parte atrás. Resta-lhe apenas a pérola. Ártaban está dois terços mais pobre.
No Egito, percorre palácios e mansões atrás do Rei. Afinal, um rei só poderia viver num palácio. Mas um velho rabino, o faz ver que o Messias jamais nasceria na casa dos ricos. Que Ele deveria ser procurado entre os pobres e desesperançados da Terra. E é para lá que Ártaban, dois terços mais pobre, mas nunca desesperançado, se dirige.
E parte outra vez. E, dessa vez, um grupo de homens lhe rouba o resto daquilo que ele tinha: a pérola. E é entre eles que ele acaba, numa colônia de leprosos. E lá ele fica, um dia, depois dois, três, quatro... e mais um, e mais outro... a vida toda. Ártaban viveu a vida toda entre os desesperançados da Terra, pobre como eles, e já quase também desesperançado. Será que ele ainda haveria de encontrar o Rei? Será que os outros três O haviam encontrado? Ele não sabia. Nunca mais soube deles.
Restava-lhe a última parte do tesouro. A pérola roubada havia sido recuperada. E com ela Ártaban havia recuperado um resto de esperança. Ele se encontrava pelo menos um terço mais rico. Por causa dele e de seus conhecimentos, todos ali se encontravam mais ricos e com mais esperança na vida e em si mesmos. Ainda faltava quase tudo. Mas já havia dignidade.
Já velho e doente, chegam notícias de Jerusalém, de um grande profeta que restituía a vida, a saúde e a esperança aos pobres da Terra. Seria ele o Rei que ele havia procurado a vida inteira desde a juventude, para quem tinha gasto todos os seus tesouros e vivido toda sua vida, sem nunca O ter encontrado? Já não lhe restavam tantas forças. Empurrado por um resto de vida, Ártaban sai para Jerusalém em busca de seu Rei. Aquela seria sua última caminhada.
Mas chega tarde. O Rei, condenado, arrastava sua cruz pelas ruas, insultado, como a vergonha de seu povo. Mesmo assim, Ártaban segue atrás, até que a multidão o impede de caminhar e ele cai exausto, debaixo de um coração velho que já não acompanha as intenções do dono.
Resta-lhe a pérola: a última parte de um tesouro gasto no pó da estrada. Mas já não há mais a quem oferecer. Da porta de Jerusalém, ele vê ao longe o seu Rei se extinguir numa cruz. E ele sequer O conheceu! Agora, o que fazer com a pérola? Ela acaba, então, nas mãos de um capitão da guarda, a fim de resgatar um prisioneiro. E ele fica sem nada. Nada mais tem a oferecer. E nem a quem.
Três longos dias se passaram depois daquela tumultuada tarde. Sem forças para voltar ou para viver, Ártaban é incapaz de poder caminhar de volta, sobre seus passos, e restituir a si mesmo a vida que perdeu. Amparado pelo fiel e resmungão criado Orontes, espera a morte.
Então, num clarão, Algo se aproxima. E ele reconhece, a sua frente, o Rei que havia inutilmente procurado a vida toda. Mas, agora, é tarde! Já não tem mais nada para lhe dar, nenhum presente!
Então ouve:
- Ártaban, você me deu todos os presentes.
- Quando foi, Senhor? Quando foi que lhe dei a safira, o rubi e a pérola?
E a voz:
- Foi quando você socorreu os meus irmãos, ao longo do caminho. Quando você lhes deu os meus presentes, foi a mim que você os deu. Todo esse tempo, Ártaban, foi a mim que você presenteou.
- Você viu, Orontes – Diz Ártaban para o servo – Ele aceitou todos os meus presentes!
E Ártaban morreu ali, cansado, mas feliz. Seu corpo foi sepultado na rocha de um jardim, num túmulo novo, onde ninguém havia ainda sido sepultado. Ártaban, enfim, havia encontrado seu Rei.
Esta história é uma resenha de “The another wise man”, de Henry van Dyke.
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