A
personificação da simpatia reside em Pouso Alegre e atende pelo nome de Gabriel
Pereira de Moraes. Sua bela casa fica no bairro Portal do Ipiranga e é cercada
de palmeiras cubanas que o próprio morador plantou. “Tenho a mão boa, primo!”,
pavoneia-se cada vez que aponta uma árvore enraizada em sua propriedade. As
mãos de Gabriel são mesmo poderosas. Com elas, o mecânico ganhou a vida
restaurando centenas de veículos antigos. Quem conhece esse brazopolense de 79
anos logo se encanta por seus modos simples e afáveis. Não foi diferente quando
ele relatou suas peripécias ao Empório Pouso Alegre.
Filho
e neto de mecânicos, Gabriel cresceu ouvindo a sinfonia dos motores
automotivos, regida por mãos untadas de graxa. Aos dois anos, engatinhava entre
carros na oficina de seu pai. Aos 10, lavava peças e ferramentas. Cinco ou seis
anos depois, já fazia consertos com extrema habilidade. Adquiriu seu primeiro
veículo, um Ford, aos 18 anos e, desde então, se especializou em montar modelos
do fabricante norte-americano.
Na
década de 1960, Gabriel concretizou o sonho de restaurar o primeiro automóvel
produzido pela Ford, em 1896. Com dianteira de madeira e volante em forma de
manche, a raridade alçou Gabriel a garoto-propaganda de uma rede de postos de
combustíveis. Nessa condição, ele viajou pelas principais cidades do Sudeste,
nas quais distribuía camisetas, bonés e chaveiros promocionais. As trocas de
óleo aconteciam em todos os postos da rede, o que atraía grande número de
curiosos. Durante sua passagem por São Paulo, em 1966, Gabriel foi convidado
por um repórter da extinta TV Paulista para participar de um programa ao vivo. O
apresentador da atração era ninguém menos que Silvio Santos.
Conhecer
o “homem do baú” foi uma experiência inenarrável. Aquele dia não sai da memória
prodigiosa de Gabriel, que venceu o concurso de carros antigos do programa
televisivo (valendo um aparelho de rádio e um prêmio em dinheiro). A emissora
custeou a hospedagem do entrevistado e, de quebra, presenteou-o com uma
fotografia do encontro inesquecível com Silvio Santos.
Gabriel
não imaginou que teria outra oportunidade de aparecer num veículo de
comunicação de abrangência nacional. A sorte lhe sorriu novamente nos anos
1970, durante uma edição da Feira da Providência, no Rio de Janeiro.
Incentivado pela amiga Lourdes, nora do ex-presidente da República Wenceslau
Braz, levou um “Ford bigode” fabricado em 1920 para expor na barraca que
representava Minas Gerais. O carro e a gentileza de Gabriel agradaram a então
primeira-dama do país, Scylla Médici, que adquiriu o Ford por 70 mil cruzeiros
(quantia suficiente para comprar 11 Fuscas na época). O fato chamou a atenção
do jornal “O Globo” que estampou em sua primeira página: “Gabriel é o máximo”.
Para
a publicação da matéria no jornal de Roberto Marinho, Gabriel foi entrevistado
na residência do famoso colunista social Ibrahim Sued, no bairro Copacabana.
Estava carimbado o passaporte que conduziria o afável mecânico para o mundo das
celebridades. Sem esforço, Gabriel conheceria inúmeros artistas, políticos e
empresários. Orlando Orfei, proprietário de circos e parques de diversão, o
contratou para restaurar 11 automóveis antigos. Entre eles estava um Lancia
1921 comprado na Itália e que havia pertencido ao gângster Al Capone.
A
ex-modelo russa Elke Maravilha também faz parte das lendas que envolvem
Gabriel. A inefável jurada de programas de calouros encomendou ao mecânico uma
Brasília com carroceria de Bugatti 1928. A entrega aconteceu em 1989, na cidade
de Araxá. Gabriel almoçou com a artista e guarda até hoje seu autógrafo,
acompanhado por um beijo de batom vermelho. Durante aquele almoço, um fã bem
vestido convidou Elke para dançar, ao que o namorado dela respondeu, batendo a
mão nas costas de Gabriel: “Negativo! Só com o meu amigo aqui”.
Outro
fato incrível envolveu o empresário Roberto Lee, que comprou de Gabriel um
carro conversível, numa sexta-feira de 1975, e o recebeu para almoçar no
domingo. No dia seguinte, o mecânico ficou surpreso com uma notícia trágica: o industriário
havia sido assassinado em São Paulo.
Gabriel
vendeu automóveis raros para os maiores colecionadores do país, como Og Pozzoli
e Eugênio de Camargo Leite, mas alguns carros que sua garagem abriga não estão
à venda. Os melhores exemplos são um Ford 1929 (conhecido como “Cristaleira” ou
“Guarda-louças” por ser o primeiro modelo da montadora a receber vidros) e um
Dodge Dart 1972 que pertenceu a um senador dos EUA.
O
discípulo mais simpático de Henry Ford costuma comprar quatro ou cinco carros
da marca norte-americana para montar um veículo com características e peças
originais, sempre com a assinatura metálica do restaurador. O material que
sobra é acondicionado na oficina do experiente mecânico. Ele trabalha
praticamente sozinho nas reformas, que duram de seis a oito meses – só não
cuida do estofamento e da cromagem. Suas ferramentas ficam em um cofre comprado
de uma agência bancária de Brazópolis.
Além
de devolver a vida para automóveis que não são mais fabricados, Gabriel
transporta noivas aos finais de semana. No ramo desde 1951, já perdeu a conta
de quantas donzelas conduziu no banco traseiro. Para tornar os enlaces ainda
mais emocionantes, ele manda confeccionar placas semelhantes às de carro,
contendo os nomes dos nubentes e a data do casório. Esse é o presente que
entrega aos “pombinhos”.
Gabriel
está prestes a entrar no rol dos octogenários, mas não para de trabalhar e de
fazer planos. Pretende iniciar em breve a restauração de um Mercedes. Cobrir o
pátio da oficina é outra ideia para os próximos meses. Nenhum obstáculo parece
instransponível para o mecânico. Homem realizado, Gabriel alcançou o sucesso
profissional com competência e, principalmente, cortesia. Conversar sobre
carros antigos foi apenas um pretexto para conhecer uma figura humana
extraordinária que, onde quer que vá, carrega sobre quatro rodas seu carisma
irresistível.
5 comentários:
Grande GABRIEL MORAIS, merecida homenagem, Brasópolis sente falta de Homens como você, abraços
Parabéns!!!!pelo trabalho. com certeza Brasópolis sente falta desse Brasopolense , com muitos que estão longe de Brasópolis.
Esse grande homem e pra quem nao o conhece direito
Pois ele e baixinho,ou seja de estatura baixa
Este realmente merece todas as homenagens em vida.
Brasópolis deve orgulhar deste cidadão.
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