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19 de março de 2013

OS DOIS IRMÃOS - Lobinho


Não sei porque cargas d’água dois franceses vieram para no Desmonte e por aí ficaram. Vieram da Guienne Française, cheios de grana. Dizem que foi um amigo – um padre francês residente em S. Caetano – que serviu-lhes de caminho para aqui chegarem.
Eram irmãos, uma dupla bizarra: O George, um varapau, e o Marcelo, um verdadeiro paquiderme, de tão grande e musculoso que era.
O capital que trouxeram compraram um armazém situado na Rua do Imperador, bem na frente do Theatro. E transformaram-no na grande firma de secos e molhados: “Armazém Dois Irmãos Cia Ltda”.
Moços ainda e sol-tei-ros...
Houve então um verdadeiro concurso entre as moças da cidade para ver quem conseguiria passar o laço no pescoço dos irmãos. E começou uma romaria interminável aos pés do altar do padroeiro da Matriz. Tudo foi empregado: Promessas, castigos, simpatias e até feitiços.
Tantos eram os bilhetes colocados nos camarins do altar, sobre os quais ficavam a sagrada imagem, que o coitado do santo deve ter se atrapalhado; ou então cochilou no momento de definir a escolha das candidatas a serem premiadas.
Só sei que, desde criança, eu estranhei aqueles casais. Quem fisgou o bambu-vestido do George foi a Mindoca. Quem pescou o Marcelo foi a Candinha.
Pelo menos, aposto que o leitor não adivinha porque o povo do desmonte achou que Santo Antonio cochilou de vez e estava na hora de se aposentar.
Mindoca – uma mulata clara, enorme e bem formada de carnes e volume – destoava completamente do seu par, seu George. Orminda, de batismo, sempre fora uma menina gorducha e muito vaidosa, filha natural da empregada de um fazendeirão do lugar. Pela simplicidade da mãe e a faceirice da garota o povo tinha uma certa tese mal oculta quanto à paternidade da Mindoca. Gostava muito de batons fortes, rouge nas faces e muita sombra nos olhos. Adorava babados e fitas no vestido, o que parecia ampliar mais ainda os seus volumes. Naquele tempo as magrelas não tinham o cartaz de hoje, pois eram consideradas feias, doentes e fracas para pôr filhos no mundo, para dar-lhes de mamar e agüentar um rojão de uma vida de dona de casa. As gordas é que estavam em alta cotação.
A Candinha – Maria Cândida no batismo – foi a outra cochilada do Santo. Para o Marcelão ele destinou uma baixinha e magrela que mal lhe chegava à cintura.
_ Como é que pode?! – Perguntavam-se os homens.
Preteridas pelo Santo na escolha, as moças da cidade puseram-no no gelo: “é para aprender a abrir os olhos na hora de escolher as melhores para os melhores partidos”.
_ Imaginem só! – diziam despeitadas – É tão lerdo que escolheu uma que nem devota dele é.
De fato, Mindoca era fanática por São Benedito, o santo da sua raça. Tanto que fizera-lhe uma promessa: “Se o Sr. Me ajudar a casar com o George, prometo enfeitar o seu andor pelo resto da minha vida”. (Por tradição era o andor e S. Benedito que sempre abria as procissões da paróquia.)
Pelo jeito... o cartaz do “pretinho” estava bem bom nas alturas celestes. E a Mindoca fazia de tudo para se exibir com George pela cidade.
Quanto ao outro casal...
Bem! O Marcelo era meio retraído sempre enfurnado na oficina e metido com motores, nem tinha noção do que se dizia na cidade.
Como ele, a Candinha também vivia ocupada com suas obrigações do lar pouco importando com a inveja e o despeito das colegas.
Não sei bem por quê, toda vez que eu os via juntos, eu me lembrava dos Brutus com a Olívia Palito dos desenhos animados do Popeye. Até hoje, quando vejo os desenhos na Tv, lembro-me daquele casal.
O povo estava de olho nos dois casais. Havia até aposta na cidade: vamos ver qual vai funcionar?
Apesar de tudo e contra todas as probabilidades, quem se engravidou foi a Candinha.
_ É pra elas pagarem a língua – disse.
Os dois irmãos, largados no mundo, enfrentaram sempre tudo juntos, apoiando-se um no outro.
Lutaram juntos na Revolução da Argélia, ficaram presos juntos, foram mandados juntos para a Guienne Françaese como prisioneiros, escaparam juntos e, escondidos por lá, enriqueceram-se. Descobertos, porém, fugiram juntos para o Brasil e vieram parar no interior.
Enquanto Seu Marcelo era um crânio para lidar com máquinas, Seu George era dado à intelectualidade e ao idealismo. Era ele que se metia sempre em confusão, arrastando consigo o coitado do irmão. (...)
TEXTO DO LIVRO: "UM MILAGRE PARA ANGÉLICA (Ficção)" DE JOSÉ ANTONIO LOBO (LOBINHO)
Editado em 2003.

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