Então convocaram toda a coorte. Sabe quanto dá isso? 600 homens! A coorte romana se compunha de 600 homens. 600 homens contra um, indefeso, desgastado ao extremo pela pancadaria sobre o corpo febril do sangramento da véspera, no horto, decerto, com sede e fome e outras necessidades não atendidas. Ele se calava. E sua estatura aumentava à medida dos golpes desferidos. João afirma que, a partir daquele momento, Pilatos procurava libertá-lo (Jo 19,12). Mas Pilatos, já sabemos, é homem do poder.E o poder se interessa pouco pela humanidade das coisas humanas.
Onde estava o Pai? Essa era a dor maior. Onde estava o Pai naquele momento. Qualquer beduíno afeito ao deserto mergulha em cisma profunda com seu comentário misterioso: basta a ausência de uma só estrela para que a caravana inteira se desnorteie. Onde estava o Pai naquela hora?
Chega a hora. Tiram a roupa vermelha de palhaço. Vestem-no com suas próprias roupas. Era a norma do Império Romano: todo condenado deveria se apresentar com suas próprias vestes, para que não sobrasse dúvida de que era ele mesmo e não outro. Também um condenado à cruz. Chega a hora. Amarram-no a um dos soldados e ele vai, totalmente, obediente, entregue e abandonado às mãos do Pai. Mesmo no silêncio, o Pai estava ali e era quase possível ouvi-lo, quase possível tocá-lo, se não fosse a total loucura do momento.
O peregrino agora caminha seu último caminho.
Quando teu navio, ancorado muito tempo no porto, te deixar a impressão enganosa de ser uma casa, quando teu navio começar a criar raízes na estagnação do cais, larga tudo, faze-te ao largo. É preciso pagar o preço que for pela alma viajora de teu barco. É preciso salvar a qualquer preço a tua alma de peregrino.
Agora, vai.
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