Hoje são
tantas atrações na vida de uma pessoa que ela pode até deixar passar a vida sem
perceber. Parece um paradoxo mas não é. O mundo real exige muita observação,
ouvidos atentos, olhar apurado, percepção sutil. Isso é o alimento da alma, e é
isso que nos dá o prazer de cada dia. Perceber e vivenciar os modismos da
atualidade não é exatamente enxergar o mundo, ver a vida. Isso são cortinas que
encobrem a essência vital; esta, feita de muitos momentos agradáveis e, na
maioria das vezes, simples, e tão simples que grudam em nossa mente por muitos
anos, por toda vida.
Momentos de
conversa com amigos, de risadas altas, conversa compartilhada sem pressa, sem
obrigação. Diz-se que recordar o passado às vezes pode ser doloroso, mas
ninguém vive sem recordações. Imagino o que os jovens de hoje recordarão no
futuro e sinto um pouco de pena deles. Tomara que sintam o que nós, jovens dos
anos 80 e 90 sentimos hoje. Acredito ser esse o motivo de minha mente ter
parado aos 20 anos; pelo menos eu sinto assim.
A correria
do dia-a-dia, o trabalho, as preocupações de hoje não são justificativas para
ninguém dizer que raramente conversa com amigos, que não os visita por falta de
tempo. O que se vê são grupos de amigos (se assim se pode dizer) aglomerados.
Sim, porque não é difícil encontrar essas pessoas em volta de uma mesa todas
teclando em um celular de última geração, todos olhando para a telinha, todos
querendo saber o que se passa lá fora. O que se passa longe parece mais
importante do que esse momento de encontro. Então é só aglomeração mesmo. A
história, as angústias, as alegrias dos presentes não importa tanto.
Do que essas
pessoas lembrarão daqui a 10 anos? Da conversa que não houve? Das histórias que
não contaram? De que? Apenas da foto tirada no momento, isso se a foto ficar
arquivada, porque impressa talvez não estará, nem em papal, nem na mente de
ninguém. As pessoas de hoje estão pós-modernamente, como diria Belchior,
apaixonadas por telefones celulares e redes sociais.
Por isso
alegro-me praticamente todos os dias por ter atravessado os anos 80 e 90,
quando brincadeiras de criança envolviam a criatividade de cada um. Cantigas,
brinquedos improvisados e noites de lua faziam a festa da garotada adolescente
daqueles anos. Banhos de chuva eram tão comuns e marcantes que ainda hoje sinto
saudades, e ainda hoje aprecio, basta chover forte. Eram momentos de puro
deleite ao lado de uma turma cujos nomes eram pronunciados dezenas de vezes em
pouquíssimo tempo, nesses momentos de alegria, quando a idade de cada um estava
mais de acordo com seu pensamento, suas atitudes. Rapazes e moças curtiam e
paqueravam ao estilo da época, enviando cartas, bilhetes, onde se podia ver a
marca registrada de cada um. Era uma época de menos tecnologia, porém de mais
calor humano.
Como era bom
não conhecer o mundo lá fora. Não saber das desgraças que hoje a TV insiste em
mostrar, enquanto deixa de lado as vitórias da humanidade. Parece que hoje se
vive do tragédia que choca e não da serenidade, da esperança, das boas
notícias.
Naquele tempo
sentíamos os doces e amargos da vida, enquanto hoje somos rodeados quase que
totalmente por uma calamidade que parece não ter fim, um caos. Será isso que
estará nas lembranças das pessoas daqui a 20 anos? É necessário muito esforço
para sentir os pés no chão, sentir o vento que nos sopra todo dia, a lua que se
apresenta à noite. Porque o mundo parece girar tão rápido que nem percebemos
essas coisas simples, mas tão importantes do dia-a-dia. As pessoas estão tão
acostumadas a buscar algo distante que esquecem das belezas que estão tão
próximas, tão fáceis. É o mundo distante que parece ser mais bonito,
interessante. Por isso acredito que recordar é algo tão bom quanto ter vivido
certos momentos, ter vivido a perfeição das coisas simples. Saudade imensa dos
anos passados.
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